Muito aguardado pelos fãs, o filme “A Bela e a Fera” estreia nessa quinta-feira (16), com Emma Watson no papel de Bela, Dan Stevens no papel de Fera, Luke Evans (Gaston) e Kevin Kline (Maurice).

Lançado pelos estúdios Disney em 1991 (com estreia no Brasil no ano seguinte), a animação, uma das mais bem sucedidas da Disney junto com “O Rei Leão” e “A Pequena Sereia”, conta a história de Bela, uma jovem considerada diferente no vilarejo onde vive com seu pai, Maurice, inventor visto como louco. Quando Maurice se perde na floresta, ele acaba sendo atacado por loucos e procura abrigo em um castelo, mas termina prisioneiro da Fera. É aí que a história de A Bela e a Fera começa. Bela vai até o castelo para salvar seu pai e acaba se tornando prisioneira no lugar de seu pai.

A narrativa aborda questões como estereótipos, o amor romântico, a quebra de padrões estéticos e a fuga do padrão de beleza e de estilo de vida. Quem já assistiu à animação A Bela e a Fera deve se lembrar do desconforto de Bela em relação às investidas de Gaston, um homem comum do vilarejo que deseja se casar com ela. Ao refutar a ideia de um casamento no modelo padrão, ela fala sobre almejar mais do que a vida em uma cidade pacata do interior.


Conversamos com a psicóloga Camila Salustiano, que atende no Zenklub pela abordagem da Terapia Cognitiva Comportamental sobre estereótipos e a coragem de fugir do padrão.

Zenklub: O que nos leva a julgar pela aparência?

Camila Salustiano: Quando nascemos, ainda não temos uma consciência formada nem valores adquiridos. Esses são aprendizados que vamos obtendo ao longo da vida. Podemos dizer que existe uma normalidade existente em toda sociedade, algumas saudáveis (como praticar exercícios e comer alimentos nutritivos), outras neutras (como almoçar ao meio dia, por exemplo) e a normalidade considerada doentia (que exige um padrão único da sociedade a qualquer custo). Aprendemos na fase da infância com nossos pais ou cuidadores o que é certo e o que é errado, ainda sem juízo de valores ou critérios, simplesmente por terem nos ensinado dessa forma, assim como podem ter sido ensinados da mesma forma por seus pais ou cuidadores e assim por diante. É fácil perceber a diferença entre crianças bem pequenas se relacionando com seus pares ou adultos e crianças mais velhas, adolescentes e até adultos. A criança pequena brinca com qualquer um, de qualquer cor, de qualquer gênero, de qualquer raça, de qualquer orientação, sem se importar com o exterior, simplesmente quer o contato pelo o que o outro está oferecendo e que pode ser prazeroso para ela. Já crianças maiores, adolescentes e adultos selecionam o tipo de pessoa que julgam “boas” para manterem relacionamentos ou não. Podemos citar exemplos em que pessoas atravessam a rua por perceberem que alguém que esteja “mal vestido” e parecendo não estar higienicamente como o esperado (por eles), por acreditarem que o que aquele exterior está mostrando seja algo de ruim ou de perigoso. Mas isso foi algo aprendido em sua vida.

Zenklub: Em um mundo onde as aparências contam cada vez mais, de que maneira é possível, no dia a dia, levar outros aspectos em consideração?

Terapia é para quem quer se desenvolver

Camila Salustiano: Percebemos que muitas pessoas se submetem a dietas rigorosas e não saudáveis, a exercícios excessivos sem procurar um profissional adequado e também as cirurgias plásticas para se enquadrar em um padrão de beleza que foi imposto pela sociedade. Quem define o que é certo? Quem define o que é errado? O próprio ser. Porém, pela falta de autoconhecimento, muitas vezes por insegurança, medo de rejeição, medo de ser quem realmente é, e sim, querer ser igual a outro que a pessoa julga ser bem sucedida, com padrão de beleza “ideal” entre outros. Acredito que estamos em um ponto em que as coisas estão começando a mudar, mas que ainda há muito enquadramento e padrões que a sociedade coloca como corretas para todos, sem respeitar a individualidade de cada ser. A terapia, antes de qualquer coisa, é um caminho para autoconhecimento, para realmente se conhecer, se respeitar, se cuidar, se acolher e dirigir a sua própria vida a partir dos seus valores. Existem outras ferramentas que também trazem como premissa essa finalidade de olhar para dentro de si e se descobrir, qual vai se adaptar melhor à pessoa é aquela com a qual ela se identificar. Mas antes de tudo é querer realmente se conhecer, se descobrir, perceber o que é seu e o que veio dos outros (aprendizados), o que faz ou não sentido pra si, quais metas deseja alcançar, quais planejamentos serão necessários fazer para que isso ocorra, e para entrar nesse caminho é preciso se despir da imposição da sociedade e se vestir do seu próprio eu para encontrar uma vida equilibrada e saudável.

Zenklub: No filme, tanto a Bela quanto seu pai Maurice e a Fera são personagens que fogem do padrão dos moradores de um pequeno vilarejo. Quais as consequências, positivas e negativas, de se viver de acordo com a sua própria essência e de se fugir do padrão imposto pela sociedade ou pelas pessoas à nossa volta?

Camila Salustiano: Também voltando aos conceitos de normalidade, atualmente estamos vivendo numa época em que ser saudável é o legal. Claro que fazendo tudo de forma orientada por profissionais especializados e sem exageros, é uma normalidade considerada saudável já que visa o bem-estar da pessoa – sem levar em conta o estético, apenas a questão da saúde. Seria um ponto positivo de uma normalidade imposta pela sociedade. Tudo sempre tem os dois lados, positivos e negativos. O negativo é quando não traz para a pessoa a felicidade que ela queria, mas sim, uma felicidade superficial que assume para a sociedade para mostrar que está dentro daquele padrão imposto. E, não só sabemos, como temos cada vez mais comprovado cientificamente os malefícios que podem trazer para a vida, como estresse, dores, doenças crônicas, transtornos mentais etc. O grande segredo da vida é o equilíbrio: conhecer a si mesmo, saber seus limites, decidir quais são para superar e quais delimitam sua marca, fazer atividades que sejam prazerosas para si, ser autêntico consigo mesmo e se respeitar e se cuidar. Quando colocamos a “máscara” para mostrar para os outros aquilo o que eles querem ver e não o que nós realmente queremos, nos negligenciamos e, como a psicossomática nos mostra, causamos doenças por enganar a nós mesmos. Quando somos sinceros conosco, somos sinceros com o próximo. Quando nos acolhemos, podemos compreender melhor o outro. Quando nos conhecemos e nos respeitamos, não deixamos ninguém decidir nossas vidas. O mais importante de ser você mesmo é ser feliz consigo, é estar bem como se está naquele momento e, se acreditar que precisa mudar, se respeitar e fazer as modificações necessárias para se estar bem consigo naquele outro momento. É deixar de lado a “máscara” e se permitir sentir, se entregar, se dar, se doar e ser aquilo que te faz bem, sem se importar com o que os outros possam pensar. A opinião dos outros será sempre a opinião dos outros, não o que você é ou está nesse momento.